quinta-feira, 27 de outubro de 2011

A morte de um diacrítico vivo

      A extinção do trema - sinal diacrítico - pode gerar, a meu ver, em curto prazo, uma confusão no falar da língua. Antes do novo acordo ortográfico, tínhamos o velho e bom dicionário para nos ajudar diante desse caso - e de outros também. Na dúvida, recorríamos a ele a fim de saber se a palavra recebia o trema ou não. Na presença do diacrítico, o grupo silábico - gue, gui, que, qui – era pronunciado. Vamos pegar a palavra “quiproquó” como exemplo, agora grafada sem o trema. Na busca pelo termo nos dicionários, vemos que a palavra significa confusão, equívoco, mal-entendido e que o termo “qui” recebia o diacrítico, sendo assim a pronúncia era - e continua sendo - diferenciada (qüiprocó). Era esse o porquê do trema! Agora, como não há mais o seu registro nos dicionários, aquele que se deparar com uma palavra que possua pronúncia diferenciada nos grupos gue, gui, que, qui e, porventura, desconhecê-la, talvez encontre dificuldade na pronúncia, ainda que recorra à ferramenta dicionário. A referência ao dicionário, nesse aspecto, perdeu-se, pelo menos a dos simples dicionários de bolso que não se aprofundam nas questões voltadas à fonética e à fonologia. Há, em língua portuguesa, no entanto, palavras cujas pronúncias se dão, frequentemente, fora do padrão culto da língua. E para quem acha que o trema era algo banal, dispensável e que merecia, de fato, ser extinto, trago à tona a seguinte questão: como você pronuncia as palavras extinguir, distinguir, quatorze, questão e adquirir? Os grupos “gui”, “qua”, “que” e “qui”, dessas palavras, nunca receberam trema, mas, ainda assim, há quem diga, erradamente, “extingüir", “distingüir", "qüatorze", "qüestão", "adqüirir”. Ainda que esses grupos silábicos não sejam pronunciados, há palavras que admitem dupla pronúncia, dentre elas: liquidação (ou “liqüidação”), liquidificador (ou “liquidificador”), sanguinário (ou "sangüinário"), líquido (ou "líqüido"), antiguidade (ou "antigüidade"), etc. E agora, a quem recorreremos se a dúvida sobre a pronúncia de certo léxico, antes marcado pelo trema, surgir? Talvez ao velho dicionário, o de antes do novo acordo e, ao nos depararmos com a palavra com o diacrítico, saberemos, assim, que aquele grupo merece pronúncia diferenciada, embora não receba mais o sinalzinho, antes temido por muitos, mas que, no meu entendimento, já faz enorme falta e nunca foi escusado. O trema esclarecia, dava precisão e, sobretudo, enriquecia a língua. O trema, como é sabido, não existe mais, todavia isso em nada altera a forma de pronúncia das palavras que o recebiam. É preciso, agora, ainda mais atenção! Atenção agora voltada à forma de falar.

É isso!

P.S.: A palavra quatorze/catorze admite duas grafias, no entanto apenas uma pronúncia: catorze. Vale salientar que, em língua portuguesa, temos apenas três acentos gráficos: agudo, circunflexo e grave. O trema não é acento gráfico, é sinal diacrítico extinto, mas que ainda se mantém em alguns sobrenomes e marcas, como: "Citroën", "Müller", "Bündchen", etc.

Abraços a todos!

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